sábado, 6 de fevereiro de 2010

Garrincha é melhor que Pelé

No dia 20 de julho de 1971, há 38 anos, a famosa seleção da Hungria, treinava no fim da tarde, já sob as luzes dos opacos refletores do antigo estádio de General Severiano.Os húngaros vieram ao Rio para enfrentar a Seleção Brasileira, continuando a série de amistosos que fizeram parte da despedida de Pelé da Seleção, do Santos e do futebot brasileiro, antes de se transferir para o Cosmos de Nova York. A escolha do campo do Botafogo pelos húngaros - podiam ter ido ao Maracanã -, porém, não foi por acaso. Ao contrário eles fizeram questão de pisar no mesmo gramado onde treinava Mané Garrincha, para eles o maior fenômeno, o maior jogador da história do futebol.

A mando de meu primeiro editor, João Máximo, do extinto Correiro da Manhã, tive o privilégio de entrevistar o craque e ídolo da seleção húngara de 1966, que havia derrotado o Brasil por 3 a 1 na Copa da Inglaterra e presenciado o último jogo de Mané com a camisa verde e amarela, Bene, autor de um dos gols e o chefe da delegação, ministro dos Esportes da Hungria, Gustav Sebes, que era o técnico da espetacular seleção húngara de 1954, espantosamente derrotada na final da Copa da Suíça, por 3 a 2, pela Alemanha.

A reportagem completa, a primeira que assinei como repórter esportivo, foi publicada na edição do dia seguinte do Correio da Manhã, página 19, sob o título de "Bene: Garrincha melhor do que Pelé" e é encontrada no arquivo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, cujo teor é o que se segue:

"Pelé não pode dizer que seja reconhecido unanimente como o melhor jogador de futebol que o mundo já viu. Alguém discorda desta opinião e este alguém merece respeito, por ser um dos melhores jogadores da seleção da Hungria - o atacante Bene. Para ele, Pelé e Puskas são dois dos maiores jogadores de todos os tempos, mas existiu um que superou a ambos: Mané Garrincha. Bene também considera a Seleção Brasileira de 1958 superior a de 70, só comparável à da Hungria de 1954.

Bene viu o Brasil jogar domingo contra a Iugolsávia e acha a nossa atual equipe um pouco inferior, em conjunto e preparo físico, à que conquistou o tricampeonato. Até mesmo justifica o fato, dizendo que "naturalmente os jogadores sentiram a atividade intensa em seus respectivos clubes e a seleção está se valendo apenas dos recursos individuais de alguns.

A equipe húngara veio ao Brasil inteiramente renovada. A média de idade dos jogadores é de 24 anos e oito deles são campeões olímpicos no México. Como revelações podem ser citados o zagueiro central Pancsics, o apoiador Fazekas e o extrema-esquerda Zango. Bene é o único jogador da equipe de 1966, que eliminou o Brasil da Copa do Mundo, em Liverpool. Continua atuando avançado, sendo o artilheiro da equipe, nas últimas partidas. Seus famosos companheiros, Albert e Farkas não vieram porque estão seriamente contundidos.

Com a sua experiência, Bene afirma que em 74 "a coisa vai ser bem mais difícil para o Brasil". Aponta a Alemanha como a grande favorita da próxima Copa, com o Brasil e a Iugoslávia em segundo plano. Hoje, eles pretendem realizar uma exibição de alto nível técnico para que a Hungria seja convidada a participar da mini-Copa do Mundo que a CBD patrocinará no ano que vem.

Os integrantes da delegaçã húngara não demonstram ressentimento pelo descaso da CBD para com eles, mas fazem questão de agradecer as gentilezas recebidas do Botafogo. O clube, através de um diretor e do supervisor Adalberto, colocou não só um ônibus à disposição da delegação, para transportes e passeios, como também o campo de General Severiano para os treinamentos.

Esquecidos pela CBD, que só anteontem à noite se fez presente no Hotel Trocadero, nas pessoas dos senhores João Havelange e Antônio Curvelo, os húngaros resolveram conhecer a cidade por conta própria e fizeram um passeio turístico naquela mesma noite. Ontem realizaram treinamento físico e tático, no Botafogo, durante uma hora. A primeira parte (35 minutos) constou de exercícios físicos e respiratórios, enquanto que, na segunda, houve movimentoss táticos ofensivos, com penetrações e chutes a gol.

Gustav Sebes, chefe da delegaçã da Hungria, era o treinador da famosa equipe que perdeu a final da Copa do Mundo de 1954, para a Alemanha. Na época era também o Ministro de Esportes da Hungria. Foi ele quem sofreu a agressão com um par de chuteiras pelas costas, do técnico da Seleção Brasileira, Zezé Moreira, após a derrota de 4 a 2, em Berna, que custara a nossa eliminação do mundial.

Sebes acha que o futebol húngaro viveu, durante quinze anos, das glórias daquela seleção. Mas, com a evolução do futebol mundial, era preciso mudar tudo. Isso começou a ser feito após o fracasso da seleção das eliminatórias do mundial de 70, quando a Hungria foi eliminada por goleada, em Marselha, pela Tchecoslováquia.

Seus jogadores haviam abandonado o ritmo de jôgo veloz pelo futebol enfeitado e cadenciado de corpo mole. Havia resistência aos modernos métodos de preparação física, bem como às novas táticas, tanto a dos brasileiros, como a dos alemães e inglêses.

Para a mudança radical, o atual ministro da Juventude da Hungria chamou o treinador Rudolf Ilovszky, antigo jogador da seleção, formado pela Universidade de Esportes de Budapeste. Ilovszky não dirige atualmente nenhuma equipe, dedicando-se exclusivamente ao preparo do selecionado. Introduziu novos métodos de treinamento, impondo rigorosa disciplina. Intensificou o preparo físico, mudando também a parte tática, dando maior segurança à defesa, ao preparo dos arqueiros, mas procurando manter a principal característica do futebol húngaro: a habilidade e a velocidade de seus atacantes, aliadas à precisão dos passes e chutes a gol.

Para Sebes, dentro de um ano esta seleção húngara, renovada com a maioria de jogadores que atuaram nas Olimpíadas do México em 68, estará em grande forma, podendo fazer excelente campanha e obter a classificação para o Mundial de 74, na Alemanha, disse.

-Esta seleção não pode ser comparada com a de 1954, pois igual aquela só a brasileira de 1958, que contava com os fóra de série, Garrincha, Didi e Pelé. Acho mesmo, a seleção brasileira de 58 superior a de 70.
Sobre a Seleção Brasileira, que viu jogar domingo no Maracanã, contra a Iugoslávia, achou muito bôa, nos primeiros 30 minutos. Depois ela caiu um pouco de ritmo, sem dúvida devido à emoção da saída definitiva de Pelé, que para ele continua sendo extra-classe. Achou Gérson magnífico, comparável a Didi; Zequinha muito promissor, mas faltando-lhe ainda muita experiência; Rivelino muito bom, mas meio dispersivo. Perguntou por Carlos Alberto, que considera o melhor zagueiro lateral do futebol mundial na atualidade, por sua atuação no México.

Sebes diz que, na Europa, as melhores seleções continuam sendo a Alemanha, a Inglaterra e a Itália. Mas que, para 1974, a Iugoslávia, a Romênia e a Bélgica, além dêles próprios, prometem muito, pois a evolução técnica do futebol destes países é muito grande. Brasil e Alemanha, porém, serão os grandes favoritos. Lembrou, ainda, o incidente com Zezé Moreira, dizendo que compreendia o nervosismo do treinador, após a derrota. Entretanto, felizmente, as relações esportivas entre as nações evoluiram muito e, hoje em dia, no esporte não vê "mais lugar para as pessoas que não conseguem dominar os nervos e as paixões durante uma competição."

José Antonio Gerheim

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